O Governo
reconheceu a situação “difícil” e “delicada” que se vive nos postos consulares,
mas nem assim toma as medidas necessárias para evitar a situação de pré-colapso
em que muitos se encontram, uma vez que continua a negociar rescisões e a não
substituir os funcionários que se aposentam.
Entretanto, enquanto os funcionários
consulares têm cada vez menos condições de trabalho e capacidade de resposta,
os utentes gastam cada vez mais tempo e dinheiro para obter os seus documentos,
criando uma situação inadmissível.
Os serviços consulares
têm um grande significado no âmbito das políticas para as comunidades por serem
um dos mais importantes elos de ligação com os portugueses espalhados por cerca
de 140 países, nos cinco continentes. Diariamente são atendidos no estrangeiro
milhares de portugueses que precisam de documentos.
O grande paradoxo é
que, não obstante o Governo reconhecer um enorme aumento da emigração
portuguesa, que está ao nível dos anos 60 e 70, nem por isso aumenta as suas
estruturas de resposta, particularmente a nível do atendimento consular, da
intervenção social, do ensino ou do apoio ao movimento associativo. Pelo
contrário, os cortes nestes domínios chegam a ser chocantes.
O outro grande
paradoxo é que os postos consulares geram anualmente milhões de euros para os cofres
do Estado e do Ministério dos Negócios Estrangeiros, mas nem assim o Governo
deixou de encerrar de forma irracional e incompreensível postos relevantes cuja
receita era superior às despesas de funcionamento, só para se ver livre dos
funcionários. A tónica geral é a de gastar o menos possível com os serviços
públicos consulares e tentar obter o máximo de receita, mesmo que entrem em
rutura ou acabem por encerrar. Um exemplo flagrante é o recente encerramento do
posto consular na Córsega, porque o Governo não substituiu o último funcionário
que se reformou, deixando assim os portugueses presos na ilha.
Na vertigem
autofágica em que o Governo atualmente vive, devora de tal maneira os serviços
públicos que eles se tornam ineficazes, atingindo brutalmente tanto os
funcionários como utentes, transformando o atendimento consular num inferno.
Não foram só as grandes filas de espera que regressaram a muitos consulados e
todo o desgaste e tensão que isso acarreta; é também o sentimento crescente de
revolta contra Portugal que se torna cada vez mais visível.
É por isso que as
políticas consulares deveriam merecer toda a deferência do Governo, no sentido
de melhorar a sua qualidade e eficácia. O que será impossível com a diminuição
drástica dos funcionários e se o atendimento consular for reduzido a um mero
ato burocrático, como acontece com as permanências consulares, apesar da sua
utilidade.
Com efeito, as
orientações do regulamento consular são cada vez menos cumpridas, porque a
saída acelerada de funcionários e a degradação das condições de trabalho e dos
salários está a tornar impossível que os postos promovam o país, a língua e a
cultura, que façam diplomacia económica, deem apoio social e mantenham a
proximidade com os portugueses através do movimento associativo, como se deve
exigir de um país como Portugal que tem vastíssimas comunidades espalhadas pelo
mundo.
Na prática, a
cegueira do Governo em prosseguir com a redução de mais 250 efetivos do
Ministério dos Negócios Estrangeiros, por via das rescisões e aposentações,
levará ao colapso de muitos postos. Enquanto o barco se afunda, como o Titanic,
o Governo vai dando música aos portugueses dizendo que vai expandir as
permanências consulares e até criar as mais que duvidosas (à luz da Convenção
de Viena) “antenas consulares”, quando pura e simplesmente já não tem
funcionários para o fazer e ainda terá menos no futuro próximo.
O que é altamente
criticável é a insensibilidade do Governo, que assim desampara e deixa agravar
o sentimento de abandono de milhares de portugueses, como se estivessem a ser
duplamente punidos por terem sido obrigados a deixar o país e, depois, por o
país os deixar à sua sorte.
Paulo Pisco | Deputado pelo Círculo da Europa
Grupo Parlamentar
do Partido Socialista
Coordenador na
Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas
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